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Especialista avalia projeto de lei aprovado que aumenta a pena para quem maltratar cães e gatos
Com a aprovação do projeto que aumenta as penas para maus-tratos a cães e gatos (PL 1.095/2019) no Senado, o tema ganhou destaque entre os operadores de Direito, uma vez que a jurisprudência tem se atualizado com relação aos direitos dos animais ligados ao Direito das Famílias.
Pela proposta, a prática de abuso, maus-tratos, ferimento ou mutilação a cães e gatos será punida com pena de reclusão, de dois a cinco anos, além de multa e proibição de guarda. Hoje, a pena é de detenção, de três meses a um ano, e multa — dentro do item que abrange todos os animais. O projeto altera a Lei de Crimes Ambientais (Lei 9.605/1998) para criar um item específico para cães e gatos, que são os animais domésticos mais comuns e principais vítimas desse tipo de crime.
Membro da Comissão de Notários e Registradores do IBDFAM, o notário Thomas Nosch Gonçalves avaliou o projeto como um grande avanço com relação ao recorte de maus-tratos. Principalmente com a explosão de casos contra os animais domésticos, ainda mais evidentes com o isolamento social imposto pela pandemia do Coronavírus.
“O projeto vem para auxiliar e proteger os animais. É importante salientar que existe um PL, que é o 27/2018, que muda a natureza jurídica dos animais não humanos, tornando-os sujeitos de direitos despersonificados. É muito significativo esse paralelo com a nova proposta aprovada”, explica.
Ele acrescenta: “O texto criminaliza especificamente os maus-tratos contra cão e gato, que representam a maior parte dos animais domésticos no País. Há a questão da reclusão, que não é mais detenção, então mudou-se todos os efeitos e reflexos criminais nesse sentido, inclusive da pena máxima. A questão da guarda, que visa proteger esse ser senciente, tratei em um artigo publicado na Revista Científica do IBDFAM”.
Não somente cães e gatos
Ainda que ocorra a sanção do inteiro teor da norma, Thomas Nosch diz que é preciso haver precaução nos próximos passos para a aplicabilidade da lei. Principalmente porque o projeto tem como lado negativo a questão de abordar apenas cães e gatos, deixando outras espécies de animais de fora.
“Ocorre uma superproteção apenas ao cão e gato,ou seja, estamos criando uma diferenciação. Fica a dúvida: o pássaro não pode ter nenhum tipo de proteção? Lembrando que são vários tipos de animais sob os nossos cuidados: estimação, os usados em pesquisa, para abate etc. São espécies diferentes, mas a punição dos maus-tratos deveria também abranger o animal que está sendo criado para o abate. Ainda que sirva para a alimentação, ele deve ter uma proteção jurídica contra qualquer tipo de agressão”, aponta o especialista.
Jurisprudências internacionais podem servir como base
Thomas Nosch ressalta que países como Áustria, Alemanha e Suíça indicam expressamente que os animais não são coisas. Por outro lado, França e Portugal dispõem que se trata de seres dotados de sensibilidade. O Código Civil Alemão, por sua vez, prevê, em seu § 90-A, que “os animais não são coisas, são protegidos por leis especiais. Eles são regulados pelas regras relativas às coisas, com as necessárias modificações exceto se de outra maneira for previsto”. Já o Código Civil Francês previu que “os animais são seres vivos dotados de sensibilidade. Salvo disposição especial que os proteja, e são submetidos ao regime dos bens”.
No Brasil, a jurisprudência e a doutrina se dividem em basicamente três correntes. A primeira se dedica a elevar os animais ao status de pessoa, haja vista que, no cerne da temática, todos nós somos animais, devendo-se, assim, serem atribuídos direitos de personalidade para eles. A segunda corrente (aplicada integralmente no presente Projeto de Lei) defende uma separação de conceitos, com a intenção de diferenciar “pessoa” de “sujeito de direitos”, possibilitando a irradiação do ordenamento jurídico aos animais, sem atribuir-lhes propriamente uma personalidade dita. A terceira corrente defende que se mantenha a visão de hoje, ou seja, que sejam considerados semoventes e classificados como “coisa”.
Nosch explica que há, ainda, uma eventual quarta corrente, baseado no atual arcabouço jurídico, teoria de bens, devendo ser aplicada até que seja editada lei que altere o status dos animais no Código Civil e na legislação competente.
“Para aplicação dessa corrente, atualmente, existe uma concepção moderna na relação jurídica, à qual parte da doutrina apelidou de ‘elemento funcional’. A ideia é oferecer uma explicação convincente de sua tese sobre a ligação dos efeitos da relação jurídica, que dá dinamismo aos elementos da relação, ou seja, a função teria um elemento integrador e justificador, tornando-se possível e suficiente uma relação jurídica sem sujeitos, aplicando integralmente aos animais, de acordo com o caso concreto”, conclui o notário.
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