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Psicanalista aponta benefícios à família em decisão que retificou registro de criança para reconhecimento de vínculo biológico com a mãe transexual
Duas mães, uma delas transexual, conseguiram na Justiça do Rio Grande do Sul o direito à retificação do assento de nascimento do filho. Concebido por relação sexual, sem auxílio de reprodução assistida, o bebê havia sido registrado como descendente biológico da mãe cisgênero, que deu à luz, e descendente socioafetivo da mãe transgênero. Saiba mais detalhes sobre o caso.
Diretora de Relações Interdisciplinares do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, a psicanalista Giselle Groeninga prevê consequências positivas da decisão na vida da família. “Uma delas é a expectativa de que poderá trazer um benefício para a identidade e autoestima de quem se viu reconhecida como mãe, não sendo reconhecido, por consequente opção dela, o valor quanto à contribuição genética que deu em função do sexo biológico”, aponta.
“No caso, priorizou-se a identidade social, a registral, a socioafetiva e o aspecto biológico apenas enquanto origem genética. Diversamente da equiparação feita anteriormente do biológico ao socioafetivo, no caso da sentença, um dos aspectos biológicos, o do sexo do material genético, se assim posso dizer, ficou em segundo plano”, acrescenta Giselle.
Ela também analisa o caso em vista do superior interesse do filho. “Há de se prever um maior trabalho mental e mesmo social quanto a ser identificado como filho de duas mães, o que já ocorre em outros casos em nossa jurisprudência, possivelmente o fato de o filho ter como mãe uma pessoa que se veja mais realizada pelo reconhecimento de tal identidade possa lhe trazer, quiçá, mais benefícios para a formação de sua personalidade. Seja como for, sempre no que envolve a sexualidade, temos uma escolha e uma expectativa”, avalia.
Inclusão da diversidade
“A decisão levanta questões importantes que – é necessário reconhecer – ainda estão sendo definidas em meio a bem-vindas incertezas trazidas por uma crescente inclusão da diversidade”, comenta Giselle Groeninga.
É importante legitimar e assegurar, segundo a especialista, o reconhecimento da diversidade em suas diversas categorias, o que implica inclusive em tentar pontuar diferenças. “Esse processo deve, também, admitir incertezas. Tal postura em muito foge do pouco conhecimento e do muito preconceito que norteava um pensamento binário e excludente”, reflete.
“É fundamental para a construção da identidade e da autoestima o reconhecimento das várias categorias das diversidades no âmbito judicial, social e registral. Reconhecimento que ganha legitimidade também a partir do conhecimento trazido pelas diversas áreas do saber”, afirma Giselle Groeninga.
Para a psicanalista, a interdisciplinaridade representa uma verdadeira democracia que vem sendo construída na área do conhecimento. “Como tal, é um saber em que se deve abrir mão das pretensas certezas unidisciplinares. A opção metodológica deve ser por um caminho em que o questionamento e as incertezas sejam admitidos”, diz.
“A questão central no tocante a ser mãe e ser pai poderia ser resumida em: o que caracteriza atualmente o reconhecimento em ser pai ou em ser mãe? E outra questão que se impõe é: em que se assentam as diferenças? Perguntas para as quais também não temos respostas únicas”, pontua Giselle.
Para ela, a decisão da Justiça do Rio Grande do Sul acrescentou o aspecto registral como fundamento para o reconhecimento da mãe como biológica, legitimando a mudança no registro de nascimento do filho. “No caso, a biologia foi considerada não em suas diferenças, mas apenas como a contribuição genética para a concepção do filho”, comenta.
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