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Justiça inglesa decide se mãe pode usar óvulos de filha morta para engravidar
Na Inglaterra, uma mulher de 60 anos luta na justiça para usar os óvulos da sua filha para engravidar. A jovem morreu de câncer, aos 28 anos ,e deixou óvulos congelados durante o tratamento. Agora, a mãe tenta provar que era da vontade da sua filha que ela engravidasse no seu lugar.
Ainda neste mês, a Corte de Apelação aceitou julgar o recurso da mulher, mas, até o momento, ela e seu marido perderam em todas as instâncias judiciais. Os juízes têm entendido que não há nenhum documento que expresse claramente a vontade da filha.
A jovem, antes de morrer, assinou os papéis dizendo que não queria que os óvulos congelados fossem descartados, mas não especificou o que deveria ser feito com eles. Segundo a mãe, foi durante uma conversa que a filha disse que queria que ela engravidasse em seu lugar. A mulher e seu marido pretendem levar os óvulos para uma clínica, nos Estados Unidos, pois lá conseguiriam o esperma de um doador para fazer a fecundação e, assim, os embriões seriam implantados no útero dela.
A juíza e professora universitária Rosana Broglio Garbin, presidente da Comissão de Bioética do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM/RS), explica que a reprodução humana assistida trouxe inúmeros ganhos, permitindo que casais ou pessoas sozinhas pudessem concretizar um projeto parental. Segundo ela, as técnicas foram se sofisticando e entrelaçando, pois a partir da reprodução heteróloga – realizada com doação de material genético de pessoa não envolvida no projeto parental – até a possibilidade de maternidade por substituição (utilização de barriga de terceira para a gestação), várias são as técnicas que suscitam problemas éticos, discutidos na área da bioética e que não alcançam consenso nem no âmbito interno dos Estados.
De acordo com Rosana Broglio Garbin, essa situação agrupa várias técnicas ligadas à reprodução assistida, como a doação de gametas masculinos, a maternidade por substituição e, na hipótese, a inseminação post mortem. “A seleção e congelamento de óvulos da filha ocorreu para que lhe fosse permitido completar o projeto parental após tratamento agressivo da doença. O congelamento do material para utilização pela própria filha, cientificamente viável e hoje até recorrente, encontra justificativa ética na possibilidade de que os óvulos viessem a ser atingidos e o futuro projeto parental de pessoa tão jovem (ainda com 28 anos) já fosse interrompido”, diz.
A juíza afirma que a gestação pela demandante, caso o tratamento impossibilitasse a sua filha de fazê-lo, também tem sido aceita. Segundo ela, no Brasil, a atual resolução do Conselho Federal de Medicina, que trata do tema, autoriza que a maternidade por substituição seja realizada entre parentes próximos. “Contudo, a inseminação post mortem não encontra maior respaldo, quanto mais que não se evidencia um projeto parental prévio, já que a filha não deixou nada expresso nesse sentido, salvo que pretendia guardar os óvulos, possivelmente ainda na esperança de uma recuperação. Também não há indicação de que forma e com quem (uma pessoa de seu círculo ou banco de doadores) teria interesse em realizar seu projeto parental. Da forma como foi relatado, é possível se presumir um projeto parental da demandante, que perdeu a filha, e assim um(a) neto(a) que substituiria a ausência dessa filha”, afirma.
Rosana Broglio Garbin explica que a grande maioria dos países veda a inseminação post mortem e que no Brasil não há legislação sobre o assunto. Segundo a juíza, a breve referência que consta do Código Civil, ao que tudo indica, permite a prática. “A atual resolução do Conselho Federal de Medicina no item VIII refere a possibilidade desta prática, desde que haja manifestação prévia. Deve-se, contudo, considerar a finalidade da reprodução assistida. Mesmo quando autorizada, a inseminação post mortem deve estar de acordo com a finalidade maior, que é a de auxiliar na resolução dos problemas de reprodução humana, facilitando o processo de procriação dentro de um projeto parental preexistente”, completa.
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