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IBDFAM ACADÊMICO - Direito de Família e Mediação: A Busca para Resolução Pacífica na Disputa de Guarda dos Filhos
INTRODUÇÃO
Ao longo do tempo a família passou por profundas mudanças tanto de caráter estrutural quanto substancial, com isso, o Direito de Família, para não estagnar no tempo, continuamente adequa-se às novidades surgidas na entidade familiar.
O presente trabalho tem como objetivo central a investigação da utilização das técnicas de mediação como uma alternativa eficiente na facilitação das relações familiares em situação de crise e conflito, mais especificamente na disputa de guarda, auxiliando aos êx-cônjuges a encontrar soluções que correspondam às necessidades de seus filhos e também as suas.
Adotar-se-á o método jurídico de interpretação estudando sociologicamente o direito como fenômeno cultural constantemente em transformação, através da aplicação de uma pesquisa bibliográfica.
As rupturas conjugais que aportam no judiciário, demonstram claramente a dificuldade dos envolvidos em distinguir as funções parentais e conjugais advindas da separação, gerando competições na disputa da guarda dos filhos. Sob este foco, a justiça estatal muitas vezes mostra-se insuficiente para solucionar os conflitos familiares embutidos de forte carga emocional, pois norteia suas decisões apenas nos fatos narrados nos processos, o que na maioria dos casos, não representa o real interesse das partes, por isso a mediação apontar-se-á como alternativa mais adequada para solucionar tais demandas, pois visa restabelecer o diálogo entre os êx-cônjuges, proporcionando uma melhor compreensão do problema, promovendo o entendimento e o respeito, consequentemente um possível acordo no que se refere ao convívio com os filhos.
Para tanto, demonstrar-se-á a viabilidade da mediação como forma de evidenciar a responsabilidade parental, possibilitando ao casal separado dar continuidade aos vínculos estabelecidos entre pais e filho(s), estimulando uma co-participação de igualdade de direitos e deveres entre o pai e mãe através da guarda compartilhada.
Revelar-se-á a mediação como forma de contribuir para o resgate da cidadania na construção de soluções mais humanizadas e integradoras, pois são as próprias partes envolvidas que conduzem a desobstrução de suas controvérsias tornando-se co-responsáveis pelos resultados obtidos.
CAPÍTULO I ORIGEM DA MEDIAÇÃO DE CONFLITOS
•1.1 Surgimento da mediação no Brasil
A perspectiva legislativa no cenário brasileiro iniciou-se com o Projeto de Lei n°4827/98 criado pela Deputada Federal Zulaiê Cobra, que possuía apenas sete artigos e permitia a possibilidade de utilização da mediação dentro do Judiciário e fora dele. Posteriormente, o Instituto Brasileiro de Direito Processual e a Escola Nacional da Magistratura trabalharam em conjunto com a deputada supra referida, e chegaram à versão de um novo Projeto de Lei n° 94, de 2002. Porém este último, que institucionalizava e disciplinava a mediação, desvirtuou-se de seu objetivo inicial, fazendo com que fosse retirado de pauta no início de novembro de 2006, sendo em abril de 2007 deferido o requerimento de reconstituição (REQ 627/07) do Projeto de Lei 4827/98.
Em março de 2007, foi apresentado à Câmara pelo deputado federal Sergio Barradas Carneiro - PT/BA, os Projetos de Lei 505/2007 e o 507/2007, sugerido pelo Instituto Brasileiro de Direito de Família - IBDFAM, que alteram o art. 1.571 do Código Civil, com vistas a inserir a mediação familiar como recomendação na regulação dos efeitos da separação e divórcio, fazendo com que "a entrada explícita da medição familiar no Código Civil, permita uma reflexão diferente sobre as funções da justiça, que deve garantir uma resposta, seja ela institucional ou não" (SASSIER, 2001, p.137/138). Esses Projetos de Lei encontram-se apensados tramitando em conjunto. O parecer do Relator Deputado Tamir (PV-SP), no qual enaltece a mediação como instrumento de pacificação social e da sua contribuição na evolução no direito de família, já foi aprovado por unanimidade na Comissão de Seguridade Social e Família (CSSF). Na última consulta realizada em maio de 2008, tais Projetos de Lei encontravam-se na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC) aguardando parecer do relator.
É notório o avanço da utilização de mecanismos extrajudiciais de prevenção e solução de controvérsias no âmbito brasileiro, embora semelhantes, por objetivarem a autocomposição, a conciliação, a arbitragem e a mediação se diferenciam.
Na conciliação o que se busca é o fim da controvérsia em si mesma através de concessões mútuas, ou seja, não ocorrendo um acordo, considera-se fracassada, já que é seu objetivo primordial. Neste ponto diferencia-se da mediação, pois o ajuste pode ser uma conseqüência natural do restabelecimento do diálogo entre as partes, e essa será bem sucedida se despertar a capacidade dos envolvidos de se entenderem sozinhos. Já no que tange ao conciliador, este atua de forma a sugerir as partes uma melhor solução, emitindo opinião sobre o caso, diferentemente do mediador que visa facilitar a comunicação entre as partes para que elas próprias administrem seus problemas, construindo saídas para desatar o "nó" conflitivo.
A negociação distingue-se das demais, pois não há a participação de um terceiro, seja imparcial ou não, neste caso a resolução do problema surge de uma autocomposição pura e simples. Pode haver ou não a participação de representantes, entendidos aqui por advogados
.
Finalmente, a arbitragem, regulada pela Lei 9.307/96, é o método pelo qual as partes submetem a solução de seus litígios a um terceiro, que decidirá de acordo com a lei ou com a equidade. Ocorre a intervenção de um terceiro, o árbitro, com poderes decisórios, julgando o conflito e impondo uma decisão, a qual deverá ser acatada pelas partes, já que o laudo arbitral tem força de titulo executivo judicial, sendo irrecorrível, passível de apreciação pelo Judiciário apenas nos casos de nulidade previsto na lei de arbitragem
Todas essas formas consensuais de solução de conflitos possuem várias diferenças entre si, porém não significa que são umas melhores que as outras, mas cada qual possui características que tornam mais adequadas a este ou aquele tipo de caso.
1.2 Insuficiência da Justiça Estatal
Tradicionalmente, o Estado exerce um paternalismo frente à solução dos problemas da sociedade, consequentemente sobrecarrega o Poder Judicante, o que com o excesso de regulamentação jurídica e a lentidão de sua atualização, provavelmente gerou a incapacidade de lidar de forma onipotente com os conflitos sociais, causando morosidade na prestação jurisdicional.
O paradigma litigioso, legitimado por séculos no Direito, que se consubstancia num jogo de sobreposições de razões, impedindo a compreensão efetiva do conflito, onde se repassa a um terceiro estranho à relação (Juiz de Direito) a responsabilidade de dizer de quem é o direito, tem-se mostrado ineficaz em gerir os problemas afetivo-emocionais, que são na maioria das vezes base das demandas judicantes familiares.
Diante deste quadro de insuficiência do modelo litigioso, pela obstrução e morosidade do Judiciário, surge à necessidade de novas alternativas frente às maneiras tradicionais de resolução dos conflitos relacionais. Dentre os quais destacaremos a Mediação, objeto de estudo em questão, por acreditar nas múltiplas vantagens decorrentes da sua utilização, principalmente no desafogamento da justiça estatal e o fortalecimento da ordem social.
De acordo com a psicóloga Muller (2005), observa-se que a mediação como forma de autocompor as diferenças, restabelece o tecido social, já que as próprias pessoas conflitantes são auxiliadas, por meio da reabertura do diálogo, a encontrar soluções criativas em que todos se satisfaçam.
A sentença judicial, apesar de solucionar a lide, muitas vezes não resolve a problemática subjacente de pacificação social, surgindo uma parte vencedora e outra vencida, ambas certas de serem detentoras de um direito subjetivo.
São necessárias reformas judiciais que abranjam aspectos institucionais, estruturais e processuais para concretizar o acesso ao Judiciário, devendo-se incentivar a distribuição da jurisdição por meios alternativos de solução de conflitos. Ademais a descentralização da jurisdição e modernização do Poder Judiciário, somada à mudança de mentalidade do operador do direito, propiciará o ideal do acesso à justiça
Devemos atentar para o fato de que o acesso à Justiça é gênero onde a prestação jurisdicional e a mediação são formas de alcançá-la. A mediação, como complemento ou como alternativa ao Poder Judiciário, constitui um meio de efetivo acesso a Justiça na medida em que difunde uma cultura de paz, devolvendo as partes conflitantes a autonomia de conduzir seus impasses, visando restabelecer a comunicação entre elas, estimulando a continuidade dos vínculos pessoais, familiares ou negociais, possibilitando que o eventual acordo tenha maior probabilidade de ser cumprido espontaneamente.
CAPÍTULO II MEDIAÇÃO DE CONFLITOS
2.1 Conceito de Mediação e Princípios Norteadores
A mediação compreende o conflito como algo natural, ou seja, próprio do relacionamento humano e necessário para o aprimoramento das relações. Segundo a visão de Groeninga (2007) "o conflito é inerente ao ser humano, sendo assim uma conseqüência da vida dialética". A questão é saber como gerenciá-lo de modo que as partes envolvidas no litígio saiam ganhando produtiva e eficazmente.
De acordo com Sales (2004) "o processo de mediação evidencia a existência de conflitos reais e de conflitos aparentes". Em muitos casos, as pessoas trazem à discussão um conflito que não é de fato aquele que está causando o transtorno momentâneo - é o conflito aparente. Normalmente, quando o diálogo sobre o conflito real causa constrangimento, vergonha, medo, as pessoas criam conflitos aparentes para iniciar a comunicação. Por isso é de fácil constatação o fato de que o conflito, que é exteriorizado muitas vezes, não reflete o conflito real, assim, não há espaço para uma discussão profícua e consciente. Esse conflito dificilmente será revelado e os atos que porventura surgirem, inclusive violentos, podem decorrer da falta de discussão do problema que está verdadeiramente causando o desentendimento entre as pessoas.
Como a mediação é um mecanismo que coloca as partes envolvidas no lugar de protagonista, estimulando o diálogo e a discussão profunda sobre o problema, desobstruindo a comunicação entre os mediandos, aperfeiçoando a escuta do outro, faz gerar a redescoberta de desejos e frustrações, que quando bem trabalhados pelo mediador podem levar os envolvidos a uma re-elaboração de seus conflitos internos e subseqüente transformação de sentimentos e atitudes, provocando a emersão do conflito real.
O principal objetivo deste método é facilitar o diálogo, auxiliando as pessoas a exprimir suas reais necessidades, bem como esclarecer seus interesses, estabelecendo limites e possibilidades para cada um, levando sempre em consideração os efeitos das decisões tomadas.
Segundo observações de Schnitman e Littlejohn (1999, p.17):
Nossa cultura privilegiou o paradigma ganhar-perder, que funciona como uma lógica determinista binária, na qual a disjunção e a simplificação limitou as opções possíveis. A discussão e o litígio como métodos para resolver diferenças dão origem a disputas nas quais usualmente uma parte termine "ganhadora", e outra, perdedora. Essa forma de colocar as diferenças empobrece o espectro de soluções possíveis; dificulta a relação entre as pessoas envolvidas e gera custos econômicos, afetivos e relacionais.
Num processo judicial, na maioria das vezes, as pessoas não dialogam, deixam a administração de seus problemas para o advogado e passam a depender da decisão de um terceiro, no caso o juiz.
De fato, a mediação assume um importante papel no resgate à participação das pessoas na efetiva solução de seus problemas, sempre por meio do diálogo. Desse modo, diminui-se a atribuição de culpas, para se analisar a responsabilidade dos atos de cada indivíduo, que passa a questionar suas atitudes e não mais apenas as ações do outro.
A mediação de conflitos é uma prática interdisciplinar cujo objetivo é a construção e ampliação de um espaço de interlocução entre as pessoas, para que estas possam perceber e reconhecer as diferenças, discutindo as divergências e negociando as convergências possíveis, no intuito de criar vínculos, transformar as possibilidades em ações concretas, reconhecendo a si mesmo e ao outro como protagonista de experiências e comportamentos que, transformados, os levarão ao consenso e a preservação do relacionamento, convertendo assim o contexto adversarial em colaborativo, por isso a mediação transcende a solução de conflitos.
Uma definição bastante abrangente é a de Tânia Almeida (apud BREITMAN E PORTO, 2001, p.45):
A mediação é um processo orientado a conferir às pessoas nele envolvidas a autoria de suas próprias decisões, convidando-as a reflexão e ampliando as alternativas. É um processo não adversarial dirigido à desconstrução de impasses que imobilizam a negociação, transformando um contexto de confronto em contexto colaborativo. É um processo confidencial e voluntário no qual um terceiro imparcial facilita a negociação entre duas ou mais partes onde um acordo mutuamente aceitável pode ser um dos desfechos possíveis.
Do conceito explicitado da mediação, podemos extrair algumas características e princípios que lhe são peculiares. De acordo com Sales (2003), a VOLUNTARIEDADE é um deles, que determina serem as pessoas livres para escolher esse método como forma de lidar com o conflito, bem como de optar pela continuidade ou desistência a qualquer momento.
A CONFIDENCIALIDADE trata da garantia do respeito à vida íntima do casal, considerando que o que é discutido não pode ser posteriormente utilizado ou divulgado, salvo por acordo entre as partes. Inclui-se neste pacto de privacidade tanto as pessoas em conflito, como o mediador, além dos os advogados que porventura participem de alguma sessão de mediação, oportunizando um clima de confiança e respeito necessário ao diálogo que embasará as negociações.
No que diz respeito ao mediador, faz-se indispensável à PARTICIPAÇÃO DE TERCEIRO IMPARCIAL, com vistas a colaborar com as pessoas, ajudando-as a comunicar suas necessidades e interesses, explicitando as possibilidades de cada um, reduzindo o conflito e até mesmo alcançando um possível acordo.
O estímulo a NÃO COMPETITIVIDADE é uma das diferenças do tradicional processo judicial. Através dessa atitude, incentiva-se a colaboração entre as partes na medida em que não se objetiva uma parte sair ganhadora e a outra perdedora, mas uma solução razoável para ambas. Permitindo assim, através da REAPROXIMAÇÃO ENTRE AS PESSOAS EM CONFLITO, a continuidade da relação, requisito essencial quando se trata de vínculo familiar.
Já em se tratando da ORALIDADE, a mediação é um procedimento informal, simples, no qual a maioria das intervenções é feita através do diálogo, minimizando os gastos financeiros e temporais.
Por último e não menos importante, a AUTONOMIA DAS DECISÕES surge como diferenciador entre os demais meios alternativos de resolução de conflitos, propiciando a retomada da autodeterminação das pessoas em relação às suas vidas, pois são elas que encontram as saídas e alternativas que mais lhes convêm, auxiliadas por um mediador que não tem poder de decisão, mas apenas facilita a comunicação. Agindo assim, no desenvolvimento da cidadania, pois implementa a importância e o valor social da responsabilidade de suas próprias decisões.
2.2 Vantagens e Limitações ao Processo da Mediação
A mediação é uma palavra que está em evidência, inserida em cursos de diversas áreas, por isso é fundamental esclarecer seu aproveitamento, de modo que não pareça uma solução de ilimitada aplicação, principalmente no que se refere aos conflitos familiares.
Observa-se na área de família um grande número de separações litigiosas e principalmente o descumprimento das sentenças judiciais, pois as mesmas não atendem às reais necessidades das pessoas envolvidas, suas prioridades e interesses. Com base na compreensão de Warat (1999), na realidade o juiz não consegue extinguir a fonte do litígio, pois o que se pretende é resolver um problema de cunho afetivo-emocional, as pessoas envolvidas neste impasse, carregam um sentimento de fracasso pelo desfazimento do vínculo conjugal, os filhos atuam como produto desta relação desfeita e o casal como representantes deste projeto frustrado.
Com vistas a esse aspecto complexo dos conflitos familiares, arraigados de emoções e sentimentos ocultos, a mediação familiar encontra sua mais adequada aplicação, pois contribui para a criação e a manutenção das relações de colaboração entre os casais divorciados preservando os laços familiares, apesar da ruptura do vínculo conjugal. Também para uma maior observância e eficácia das decisões mutuamente edificadas, já que cabe às próprias partes litigantes à construção de uma solução adaptada as suas necessidades e não uma sentença imposta por terceiros. Incluindo a rapidez e agilidade no processo, pois são as partes que negociam a duração da mediação, cabendo ao mediador apenas controlar a velocidade do combinado pelos participantes, e por conseqüência redução dos custos financeiros ligados aos processos, isentando-se inclusive de custas e despesas judiciais.
A vantagem mais relevante segundo Milton de Oliveira (2007), diz respeito à diminuição dos desgastes emocionais, em face de não estimular a contradição e nem se busca desmentir os implicados, ao contrário, procura-se clarear as diferentes percepções dos envolvidos, sem que sejam desqualificadas, pois perceber diferentes aspectos de uma mesma questão não necessariamente implica que uma das partes esteja mentindo.
No que concerne à mediação familiar propriamente dita, as finalidades traçadas seguem no sentido de oferecer ao casal em fase de separação um contexto adequado à negociação, possibilitando a sua autodeterminação; garantindo a continuidade das relações paterno-filiais e fomentando a co-parentalidade; prevenindo os descumprimentos de acordos de regulação do exercício do poder paternal; alterando formas de comunicação disfuncionais e reforçando a capacidade negocial do casal em fase de separação. Além disso a facilitação da comunicação entre os ex-cônjuges possibilita a escuta e o entendimento mais apurado das reais necessidades e sentimentos de cada um, auxiliando a desfazer as mágoas, a reconhecer-se e consequentemente respeitar-se mutuamente. Afetando diretamente de forma benéfica a relação com os filhos, já que o principal interesse, passa a ser o bem estar dos mesmos.
Apesar das vantagens da mediação familiar serem óbvias, existem situações nas quais tal processo não deve ser indicado nem utilizado: casos em que há grandes desníveis de poder entre os mediandos; quando entre os pais não existe uma relação de igualdade e respeito recíproco; na incidência de violência doméstica, maus tratos infantis ou toxicodependência; em caso de doenças do foro psicológico ou mental de um ou ambos mediando que impedem a comunicação e tomada de decisões.
Essas situações que não são resolvidas por meio da mediação podem ser tratadas por procedimento judicial tradicional e ainda por outras formas alternativas à jurisdição. Cada caso, adequa-se mais ou menos aos vários métodos de resolução de conflitos, consensuais ou não.
2.3 Profissional da Mediação
A mediação tem por objetivo primordial transformar um contexto adversarial em colaborativo, e a responsabilidade das decisões cabe às próprias partes envolvidas no impasse, pois o mediador é um terceiro imparcial que tem a função precípua de restabelecer a comunicação produtiva e colaborativa entre elas, para que possam identificar os seus reais interesses e construírem alternativas para solucionar o conflito. Por isso este profissional não pode perder de vista a principal característica desta técnica, que é a autonomia de vontade das partes.
A credibilidade da mediação, como processo eficaz para solução de controvérsias, está diretamente relacionada com o desempenho do mediador, que deverá pautar seu trabalho na qualidade técnica, seguindo os princípios éticos que regem sua atuação: a imparcialidade, a credibilidade, o sigilo ou a confidencialidade, a competência, a diligência e a flexibilidade.
"O mediador familiar deve possuir conhecimento de relações interpessoais, habilidade no manejo do conflito e negociação, assim como conhecimentos básicos no Direito de Família" (BREITMAN e PORTO 2001, p.49).
No âmbito do direito de família, frequentemente na aplicação do direito, há situações que ultrapassam os limites instituídos em lei, fazendo-se necessário a interligação do Direito com outras disciplinas, por isso deve-se ressaltar a figura do co-mediador, que é um profissional auxiliar, especializado na área do conhecimento subjacente ao litígio, que atuará em conjunto com o mediador, o que permitirá uma maior reflexão e ampliação da visão nos aspectos controversos, propiciando um melhor controle da qualidade da Mediação.
As principais habilidades para a atuação do mediador são descritas por Breitman e Porto (2001) como: a capacidade de articular o diálogo e de otimizar a interação, estabelecendo relações empáticas, fazendo com que uma pessoa se coloque no lugar da outra para compreender seus pontos de vista e atitudes, e entender suas reais necessidades e limites.
Observa-se que a profissão de mediador está para além da sua formação de base (Direito ou Psicologia, por ex.), já que o principal pré-requisito é a competência técnica para auxiliar as partes a restabelecer a comunicação, auxiliando-as a desenvolver opções criativas e exeqüíveis com vistas a resolver seus problemas. Na mediação, a solução do conflito é criada e encontrada pelas partes, e não pelo mediador, sendo assim, qualquer cidadão devidamente capacitado será apto para desenvolver o trabalho do mediador, independente da natureza da sua formação acadêmica.
Existem entidades como o Conselho Nacional das Instituições de Mediação e Arbitragem (CONIMA), voltadas ao desenvolvimento dos meios alternativos de solução de conflitos, que dispõe de cursos de capacitação, bem como de Regulamento Modelo e Código de Ética, destinados a qualificar os profissionais e a preservar a ética e credibilidade da Mediação.
CAPÍTULO III MEDIAÇÃO NO DIREITO DE FAMÍLIA
3.1 A Família e Suas Transformações ao Longo da História
A família é a matriz, a formadora da identidade, quem molda a individualidade de seus membros. É o espaço onde os indivíduos se desenvolvem e tornam-se diferentes dos outros, mesmo pertencendo a um grupo com história comum.
A família sofreu uma série de transformações ao longo dos séculos no Brasil e no mundo todo, quanto à natureza, a função, a composição e a concepção. Essas mudanças continuam acontecendo, pois a família é produto do sistema social e reflete o estado da cultura desse sistema, explicando-se assim o fato de praticamente todas as sociedades se organizarem em famílias, apesar de serem entidades bastante diversas.
A reorganização da família durante o século XVIII, antes pública, passa a reforçar uma condição de vida mais particular em detrimento do constante convívio social, a reforma dos costumes deixou um espaço maior para a intimidade, estimulando uma maior convivência entre pais e filhos, reduzindo a família a esses entes. Fazendo surgir à família nuclear moderna, formada por pai, mãe e filhos, morando num local próprio tal como a conhecemos nos dias atuais.
No Código Civil de 1916, a família era matrimonial, patrimonial e patriarcal. A sociedade conjugal só era formada através do casamento, que tinha como objetivo principal a preservação do patrimônio, ficando todas as outras formas de união efetiva, à margem da lei, pois não tinha importância jurídica o vínculo afetivo entre os componentes da família, sendo o foco da sua proteção à família legítima.
Com o advento da Constituição Federal de 1988 e do Código Civil de 2002 houve uma ruptura com a antiga estrutura estabelecida pelo Código Civil de 1916, a família na Constituição Federal está prevista nos artigos 226 e seguintes. Entende-se que a família ou entidade familiar não é formada apenas a partir do casamento, aceitando tanto a família monoparental, formada pelo pai ou pela mãe e pelos filhos, quanto à união estável entre homem e mulher.
Diante das transformações advindas com a Carta Magna de 1988, nota-se uma ruptura com os antigos conceitos, sendo as relações contemporâneas, pautadas na afetividade. É ela, a afetividade, a base do direito de família, a mola propulsora das relações contemporâneas, capaz de gerar direitos e obrigações na seara familiar.
Nesse sentido Maria Berenice Dias (2005) preceitua que "não há como negar que a afetividade é um fator determinante na formação dos núcleos familiares". A base do Direito de Família é o afeto e este deve ser sempre o critério utilizado na análise da tutela dos direitos inerentes aos indivíduos inseridos no contexto familiar.
O que identifica a família hoje já não é, nem a celebração do casamento, nem a diferença de sexo do par ou do envolvimento de caráter sexual. De acordo com Dias (2007) "o elemento distintivo da família é a identificação de um vínculo afetivo, a unir as pessoas, gerando comprometimento mútuo, solidariedade, identidade de projetos de vida e propósitos comuns".
3.2 Causas Geradoras dos Conflitos Familiares e os Freqüentes Efeitos da Separação Conjugal Perante os Filhos
Partindo-se da análise do casamento, quanto a sua formação, desenvolvimento e extinção, serão abordados alguns aspectos que geram conseqüências jurídicas e afetivas perante os filhos.
De acordo com os artigos 1511 e seguintes do Código Civil, o casamento tem por fim promover a união do homem e da mulher, de conformidade com a lei, a fim de que cuidem da prole em comum e prestem assistência mútua.
No Brasil o instrumento jurídico para finalizar a sociedade conjugal é a separação judicial e o instrumento jurídico para a dissolução do casamento é o divórcio.
Os relacionamentos estão sujeitos à instabilidade, distanciando-se do juramento de amor eterno assumido perante a Igreja, já que se modificaram os papéis do homem e da mulher na sociedade moderna. Atualmente a instituição familiar está assumindo um perfil mais centrado na qualidade das relações entre as pessoas e no desejo de cada indivíduo.
A crise conjugal afeta diretamente o vínculo estabelecido entre o par e o vínculo de cada um dos pais com seus filhos. Segundo Cezar-Ferreira (2004):
a crise da separação conjugal é um evento de tão forte intensidade afetiva que sempre provocará um impacto sobre os filhos, tanto no presente da agudez do momento processual, quanto no futuro, no que diz respeito à criação deles, com a inerente manipulação de ligações, vínculos e afetos. Podendo acarretar desde desestruturação emocional momentânea até interferências de sentimentos em sua vida diária.
Como membro da família afetivamente mais sensível, a criança percebe mais facilmente os efeitos nocivos de uma desestruturação familiar, e por esse motivo sofre os maiores prejuízos emocionais e comportamentais.
Frequentemente os filhos são utilizados, nem sempre de forma consciente, para disputar afeto e poder, situação onde não há vencidos nem vencedores, somente um grande desgaste emocional. O conflito de lealdade descrito por Cezar-Ferreira (2004), diz respeito à escolha com quem ficar, se com o pai ou com a mãe, e pode ser compreendido como incapacidade dos filhos em estarem bem com um genitor sem sentirem que estão traindo o outro. Tal conflito é constantemente manipulado pelos pais que se utilizam dos filhos para vingar-se do ex-cônjuge, causando as maiores fontes de sofrimento das crianças. Além disso, após a separação os filhos continuam a ser tratados como instrumentos de revide, na medida em que o pai não quer pagar a pensão convencionada e mãe em contrapartida dificulta o direito de visita, ou de modo inverso.
Outro aspecto importante e causador de diversos problemas é o da questão da guarda dos filhos, pois essa se torna objeto de interesses conflitantes e competitivos entre pais, quando deveriam assegurar aos filhos a oportunidade de se desenvolver como membro de uma família, que apesar de modificada, permanecesse como um lugar de acolhimento e proteção.
Os pais devem conduzir da melhor maneira possível à separação ou a dissolução da sociedade de fato, para que os prejuízos aos seus filhos sejam os menores possíveis, visando sempre à premissa constitucional do bem estar da criança e do adolescente.
3.3 A Guarda dos Filhos e a Aplicabilidade da Guarda Compartilhada
Com a instauração da separação conjugal ou do divórcio, a vida conjugal é totalmente modificada, principalmente no que concerne aos filhos, visto que estes devem obediência aos pais, devendo, porém, ser considerada suas opiniões nos assuntos familiares importantes, de acordo com o nível de sua maturidade. Neste contexto familiar insere-se o poder parental, que regula a vida dos filhos até sua maioridade.
O poder parental consiste na responsabilidade dos pais em velar pela segurança e saúde dos filhos, prover o sustento, dirigir sua educação e administrar seus bens. Em caso de separações judiciais ou divórcio, o genitor que não detiver a guarda do filho, não perde o poder familiar, que consiste num complexo vasto de direitos e deveres dos pais em relação aos filhos. Porém, o destino do filho, os alimentos a este devidos, e a forma de prestá-los serão regulados por acordo dos pais, sujeito a homologação judicial, que pode ser recusado em caso de não corresponder aos interesses do menor. Na falta de acordo, o juiz decidirá de harmonia com o interesse do menor, a quem poderá ser confiado à guarda dos filhos, isto é, aos pais ou a terceira pessoa, e a forma como a guarda será exercida.
Nesse direcionamento Eduardo de Oliveira Leite (1997) ensina que:
Hoje é unânime o entendimento de que o pátrio poder é muito mais pátrio dever, mas não só 'pátrio', na ótica do constituinte de 1988, mas sim 'parental', isto é, dos pais, do marido e da mulher, igualados em direitos e deveres, pelo art. 226, par. 5º, da nova Constituição.
A expressão guarda, refere-se mais a objetos, um resquício de quando os filhos eram considerados posse dos pais. Pode ser interpretada juridicamente para expressar um direito-dever de assistência educacional, material e moral, a ser cumprido no interesse e em proveito do filho menor, garantindo-lhe a sobrevivência física e o pleno desenvolvimento psíquico.
A guarda deve sempre resguardar o princípio do melhor interesse do menor, podendo ser deferida nas seguintes modalidades: Guarda Única ou Dividida, Guarda Alternada, Aninhamento ou nidação e Guarda Compartilhada.
A Guarda única, dividida ou unilateral é o tradicional sistema, em que o menor fica com um dos pais, em residência fixa, recebendo visitas periódicas do outro. Segundo Maria Helena Diniz (2003, p. 1.978) "o genitor que detém a guarda exerce o poder familiar de forma continua enquanto que o outro, o genitor visitante, exerce o poder familiar de forma descontinua, em intervalos de tempo, durante as visitas". É bastante criticada, tanto pelas ciências da saúde mental como pelas ciências sociais e jurídicas, uma vez que proporciona o gradual afastamento entre pais e filhos, até que se verifique o fenecer da relação, bem como afronta os princípios constitucionais da isonomia e melhor interesse do menor.
A segunda modalidade de guarda, chamada de Alternada é aquele modo que possibilita aos pais a maior parte do tempo possível com seus filhos. Caracteriza-se pelo exercício da guarda, alternadamente, segundo um período de tempo pré-determinado, que pode ser anual, semestral, mensal ou mesmo uma repartição organizada dia-a-dia, detendo de forma exclusiva, durante esse período de tempo, a totalidade dos poderes-deveres que integram o poder parental. Ao termo do período, os papéis invertem-se. É bastante criticada em nosso meio, uma vez que contradiz o princípio da continuidade do lar, que deve compor o bem estar da criança. Constata-se, também, que se faz prejudicial à consolidação dos hábitos, valores, padrões e formação de sua personalidade, face á instabilidade emocional e psíquica criada pela constante mudança de referenciais.
A terceira modalidade de guarda é a chamada de Nidação ou Aninhamento. Por este modelo, os filhos passam a residir em uma só casa; no entanto, os pais são quem a ela mudam-se, segundo um ritmo periódico. É a guarda menos usada e muito pouco defendida.
A quarta e última modalidade de guarda, a que está sendo defendida neste trabalho, é chamada de guarda compartilhada na qual os filhos tem residência principal, mas a ambos os pais é dada à possibilidade de continuarem a ter efetiva e equivalente autoridade legal para tomarem decisões importantes quanto ao bem estar de seus filhos, participando com maior assiduidade e paridade nas decisões que dizem respeito a eles, além de aumentar a disponibilidade do relacionamento com pai ou mãe que deixa de morar com a família. No entendimento de Águida Arruda Barbosa apud Hironaka (2002, p. 61):
A guarda compartilhada assegura uma convivência mais igualitária com ambos os genitores, diminuindo a angustia e o sofrimento dos filhos e do destituído da guarda, em virtude da separação. Além disso, facilita a inclusão dos filhos no convívio com os pais e seus novos relacionamentos na medida em que recuperam a capacidade de reconstrução da vida afetiva.
O Projeto de Lei n°6350/2002 que dispões sobre a guarda compartilhada no Brasil, já foi aprovado na Câmara dos Deputados em 20 de maio de 2008, restando apenas à sanção presidencial para conversão em lei.
Com o respaldo do Estatuto da Criança de do Adolescente e da Constituição Federal, o instituto da guarda compartilhada tem por escopo tutelar, não somente o direito do filho a convivência assídua com os pais, assegurando-lhe também o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social completo, além de referência masculina/feminina. Visa também o direito do genitor de desfrutar da convivência assídua com o filho, perpetuando não apenas seu patrimônio genético, mas também seu patrimônio cultural, axiológico e familiar, pela repartição não só de tempo, mas de atitudes, atenções e cuidados como meio de permanência dos laços afetivos e familiares.
3.4 A Mediação como Meio de Viabilizar a Guarda Mais compatível com a Dinâmica Familiar Contemporânea
Dentre as crises familiares, nenhuma produz mudanças tão profundas em tantas vidas como à separação conjugal. Conforme preceitua Cezar-Ferreira (2004, p.48):
A separação é uma crise que traz muitas perdas, mas não significa a destruição da família. Dessa crise, a família pode sair tanto desorganizada e sintomática, quanto evoluída e fortalecida, porque crises também são oportunidades para o crescimento.
A separação ou a ameaça dela gera grande risco e ansiedade; o risco de perda provoca imensa dor. Mas mesmo esse tipo de crise se bem administrada com o movimento de proteção e cuidados, pode reorganizar ao vínculo do ex-casal, independente da ruptura do relacionamento conjugal, e fortalecer os vínculos com os filhos, ressegurando que o fim do casamento não significa necessariamente, para eles, a perda do pai ou da mãe
Em meio ao sofrimento e complicações de ordem emocional vividos pelos casais em crise e em processo de separação, a mediação pretende servir de auxílio técnico na reorganização do sistema familiar, em virtude da transição da família nuclear, formada por pais e filhos que moram na mesma casa, para a família binuclear, nesta última o pai e mãe estão separados, morando em residências diferentes e os filhos do casal passarão a conviver nesses dois lares. A família binuclear, não deixa portanto de ser uma família, apenas se divide em dois núcleos após a separação ou divórcio, mas ambos os progenitores continuam a assumir o mesmo que antes no que se refere aos cuidados de educação dos filhos, atendendo às suas necessidades afetivas, econômicas e físicas. Desta forma contribuem para suprir ou diminuir o impacto negativo do divórcio nos filhos. "O divórcio visa romper o vínculo matrimonial, mas não tem o intuito de cortar os laços familiares" (CRUZ, PEREIRA e SOUZA, 2004). Assim, as crianças podem se beneficiar, de modo que o relacionamento entre os pais passa a ser de cooperação e apoio em relação aos filhos, e estes por sua vez, passam a vivenciar o divórcio sem perturbações pois os pais passam a ser parceiros nos cuidados parentais, reforçando assim os laços de relação familiar.
O acordo sobre a regulação do exercício do Poder Parental assume especial importância, sendo este o campo privilegiado de atuação da Mediação Familiar, denotando uma particular preocupação com o desenvolvimento psicológico e afetivo das crianças, na tentativa de minimizar o seu sofrimento uma vez iniciado o processo de divórcio, possuindo como objetivo a manutenção de uma relação estável e duradoura entre pais e filhos.
Quando os pais não conseguem chegar a um acordo no que diz respeito à regulamentação de guarda dos filhos, e recorrem ao Judiciário, algumas questões são resolvidas quase que mecanicamente pela regra de visitação. Essa fórmula padrão que preceitua quem do casal fica com a guarda continuada, cabendo ao outro o direito de visita, possuindo este último a titularidade do poder familiar, restringido, porém, o seu exercício. Apesar de legal, pode ser fruto de eventuais discórdias principalmente quando o casal vive em conflito, além de submeter à criança a uma agenda que não reflete sua necessidade e vontade.
A guarda compartilhada destaca-se na preservação do melhor interesse da criança, na medida que trata-se de um compartilhamento de direitos e deveres entre os pais separados, com a finalidade de que ambos dividam a responsabilidade e as principais decisões relativas aos filhos. É primordial que o menor tenha uma residência fixa, seja ela na casa do pai ou da mãe, devendo os filhos passarem um período com o pai e outro com a mãe, sem que se fixe prévia e rigorosamente tais períodos de deslocamento. Pois conforme acentua Filho (2000, p.92):
O menor necessita contar com a estabilidade de um domicílio, um ponto de referência e um centro de apoio para as suas atividades no mundo exterior, enfim, de uma continuidade espacial (além da afetiva) e social, aonde finquem suas raízes físicas e sociais, com o qual ele sinta uma relação de interesse e onde desenvolva uma aprendizagem doméstica, diária, da vida.
Porém, entendemos que essa liberdade de deslocamentos de lares sem pré-determinação só terá efeito em ex-casais que tenham um bom relacionamento. Isso não quer dizer que a guarda compartilhada não poderá ser deferida quando houver uma dissolução conjugal litigiosa. Já que nas hipóteses de dissolução conjugal consensual já se supõe a existência de guarda compartilhada.
Pelo contrário, conforme preceitua Dra. Sandra Vilela (2007), "um casal que vive em permanente conflito, fará mal a seu filho independente do tipo de guarda adotado". Pois de acordo com estudos psicológicos os efeitos prejudiciais que a criança terá diante do litígio entre seus pais, será idêntico seja na guarda única ou compartilhada.
Apesar de o juiz ter uma função social, é fácil constatar que casais em litígio não conseguem resolver suas desavenças em uma ou duas audiências, em se tratando de dissolução conjugal, existindo no final do processo sempre um vencedor e um perdedor, continuando assim a existir o rancor entre o casal, acarretando grande prejuízo para seus filhos.
Dessa maneira, entendemos que o mais importante é amenizar os conflitos entre os êx-cônjuges por meio da mediação familiar, que deve ser estimulada pelos juizes através da explanação do que significa e quais suas vantagens, facultando as partes a aceitarem ou não.
A mediação familiar tem o objetivo de restabelecer o diálogo truncado pela falta de comunicação e entendimento entre as partes, trabalhando dentro dos aspectos emocionais, psicológicos e legais do processo, informando para os cônjuges os meios de guarda que existem e as conseqüências que cada uma acarretará para o menor, possibilitando-os escolherem, por si só, qual o melhor modelo de guarda para seus filhos, sempre prevalecendo o interesse do menor, que entendemos ser a guarda compartilhada.
Segundo Schinitman e Littlejohn (1999, p.210):
Por meio do diálogo as pessoas podem atingir uma clareza sobre suas próprias idéias, bem como sobre as idéias dos outros. Elas passam a perceber como até mesmo os que se encontram no mesmo lado da questão podem discordar em alguns pontos e elas também passam a perceber que os oponentes podem ter preocupações em comum. (...) O diálogo não leva, necessariamente, ao acordo, mas pode resultar em entendimento e respeito entre adversários.
Como a guarda compartilhada está fundada na responsabilidade do pai e da mãe, a escolha pela mediação permite, devido às técnicas contidas em seu processo, viabilizar a individualização do par conjugal e do par parental, evidenciando as diferenças da conjugalidade e da responsabilidade.
É possível finalizar qualquer relação, menos aquela fundada na parentalidade. Portanto a relação entre pais e filhos não se extingue por nenhuma razão e de nenhuma forma, ainda que as aparências possam contrariar tal afirmativa (CEZAR-FERREIRA, 2004).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Conforme observado durante todo o estudo, a separação ou o divórcio separam marido e mulher, mas não anula os laços que vinculam os pais e seus filhos, pois a ligação da filiação continua imutável apesar da ruptura conjugal. Isto porque a família não se extingue, mas apenas se transforma estruturalmente.
A separação e o divórcio são comumente precedidos de conflitos, e estes tendem a se estender já que as decisões são repassadas aos juízes que procuram solucionar os litígios baseado apenas em critérios legalmente estabelecidos, sem contudo, atentar para os critérios subjetivos que envolvem as dissoluções conjugais.
Por outro lado, a mediação visa à pacificação do conflito familiar através de uma solução obtida pelas próprias partes, com o auxílio do mediador, ao contrário da resposta dada pelo Poder Judiciário, que, por ser imposta apenas de acordo com a análise do que consta nos autos, é constantemente desobedecida visto que não atende as reais necessidades dos litigantes, originando novos conflitos.
Portanto havendo desavenças entre os êx-cônjuges, no momento da ruptura conjugal, é de fundamental importância a utilização da mediação como meio deles externarem suas reais necessidades e interesses, possibilitando desta forma a abertura do diálogo truncado, tornando possível o entendimento e respeito entre os propensos adversários.
Com isso cabe ao casal em litígio estar disposto a participar do procedimento da mediação, com vistas a desinstalar a crise decorrente da separação, tendo por objetivo primordial permitir que os filhos não sejam prejudicados.
Compete também ao Poder Judiciário se propor a estimular esse método aqui abordado, como meio alternativo de solução de conflitos familiares, tendo por finalidade disseminar no âmbito jurídico uma visão mais ética dos litígios interpessoais, em outras palavras humanizar a justiça.
Na mediação não se pretende encontrar um culpado pela separação. Por ser uma forma não adversarial de resolução de conflitos não se estimula a disputa e o antagonismo, por isso não se materializa a figura do vencedor e do perdedor da demanda como nos procedimentos jurídicos tradicionais, mas se preocupa com a responsabilização das partes, para que mesmo após a dissolução da sociedade conjugal permaneça a relação de co-parentalidade entre pais e filhos.
O procedimento da mediação permite o restabelecimento da comunicação entre os êx-cônjuges, o que favorece a conscientização dos seus direitos e deveres, e consequentemente à necessidade de preservarem seus papéis de pais, viabilizando assim a adoção do modelo de guarda compartilhada.
A guarda compartilhada privilegia a continuidade do vínculo afetivo da criança com ambos os pais, quando fragmentada relação do casal conjugal, objetivando atenuar os efeitos danosos da separação. Permite também a divisão de responsabilidades, pois não há o desnivelamento de poderes observado na guarda única, onde o não guardião tem seu exercício de poder familiar enfraquecido em detrimento do genitor que detém a guarda. Na guarda conjunta o exercício dos direitos e principalmente das responsabilidades e deveres são desempenhados conjuntamente pelos genitores, ambos participam mais direta e igualitariamente do convívio com os filhos.
A responsabilidade parental na guarda compartilhada é melhor distribuída entre os pais. Ao contrário da guarda unilateral, tradicionalmente adotada pelos nossos Tribunais, onde o afastamento do não guardião gera uma dificuldade no relacionamento entre pai, mãe e filhos(s), privando inclusive a criança do convívio familiar, refletindo em graves conseqüências psicológicas para a prole, principalmente quando os genitores não matem bom relacionamento entre si e utilizam os filhos como objetos de disputas.
Na interpretação do princípio do melhor interesse da criança deve-se considerar a importância da necessidade de manutenção dos vínculos parentais.
Portanto, um processo de medição bem conduzido privilegiará os reais interesses dos pais, atendendo o melhor interesse da criança, possibilitando a escolha do modelo de guarda mais apropriado, qual seja, no nosso entendimento o da guarda compartilhada, efetivando, dessa forma, duas garantias constitucionais: aos filhos, a convivência familiar de maneira saudável e, aos pais, a igualdade no exercício de suas responsabilidades.
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